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COLUNA DA GISELLI AVÍNCULA: O sonho de volta às aulas

Texto 1

Nos últimos quatro anos, tenho alguns “sonhos” nada agradáveis na iminência do fim do recesso e das férias escolares. São questões dramáticas e bem reais da sala de aula: agressões verbais e/ou físicas entre mim e os alunos, como também entre os próprios estudantes. O sentimento pessoal de impotência e a constatação do desamparo institucional diante da violência escolar não são oníricos, e sim extremamente reais.

Acordo assustada e, aliviada, percebo que foi um sonho... Ademais, o nível de exposição às violências físicas e simbólicas está reduzido para mim. Deixei de atuar como professora regente após um estresse pós-traumático, estou afastada da sala de aula, readaptada de função há dois anos e reinserida em outra atividade escolar, atuando na biblioteca como agente de leitura.

As ameaças de alunos sobre professores são uma das principais formas de violência contra docentes no ambiente escolar, de acordo com o livro Violências nas escolas, coordenado por Miriam Abramovay e Maria das Graças Rua. Os fatores geradores cruciais são a indisciplina e as notas baixas, segundo este estudo publicado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), em 2002. No entanto, as especialistas em violências nas escolas e juventudes alertam que a violência no cotidiano escolar deve ser reconhecida no plural por “violências”.

Há um tipo de violência escolar tão perniciosa quanto a violência física e simbólica entre alunos e professores: a violência institucional. Esta vitima e expropria o protagonismo da comunidade escolar, pois profissionais da educação, pais e alunos não se sentem donos dos espaços. O conjunto de regras que normatiza as relações entre os membros do corpo técnico-pedagógico e discentes, bem como a estrutura hierarquizada e o princípio de autoridade, produzem variadas percepções no processo de escolarização sobre a escola onde estudam ou trabalham. Tais questões, por conseguinte, desencadeiam reações violentas por parte dos alunos e desmotivação profissional entre professores.

O caminho é desistir do Magistério? Buscar nova profissão? Enveredar nos preparatórios para cargos de técnicos e analistas para concursos públicos? Confesso que tentei tudo que fora listado. Não fui muito persistente nessas alternativas, batia um desânimo tão grande quanto o sentimento de desvalorização da docência. Percebia-me reinventando e buscando alternativas para manter-me no universo da educação. Por que insistir em garimpar novas estratégias e práticas que não me afastem da escola? Ainda não encontrei respostas definitivas. Algumas hipóteses.

“Eu tenho um sonho...” Parafraseando o discurso tão esperançoso por uma sociedade sem distinção de cor, de Martin Luther King para cerca de 250 mil pessoas na década de 1960, escrevo:

Que a escola seja um espaço coletivo pensado e feito por professores, alunos e toda comunidade escolar, capaz de refletir e reinventar o processo pedagógico articulado com os anseios, identidades e práticas sociais dos seus atores. De modo que os encontros de singularidades – estudantes, professores, pais, direção e demais membros do corpo pedagógico/administrativo – não sejam trabalhados de forma fragmentada e seccionada, segmentando o ensino e a aprendizagem, a produção de conhecimento, o envolvimento dos responsáveis e a gestão escolar. Sonho com um cotidiano escolar de ações educativas que envolvam a comunidade em expressividade e protagonismo, num processo contínuo e progressivo da dinâmica democrática, dialógica, interpessoal e afetiva.

Referência:

ABRAMOVAY, M.; RUA, M. G. Violências nas escolas. Brasília, DF: UNESCO, 2002.

(Sou a Giselli Avíncula, professora de Sociologia, mestra em Ciências Sociais e bacharelanda em Terapia Ocupacional. Hoje, atuo como agente de leitura. Alimento a teimosia da minha alma educadora, acredito na inteligência emocional e na potencialidade dos fazeres humanos para sensibilizar o potencial por conhecer.)