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COLUNA DA GISELE MAGALHÃES: Professor, não neglicencie sua saúde

Texto 9

Não são raras as vezes em que escuto comentários sobre o que chamam de “vida mansa” dos professores, tais como: São uma classe de trabalhadores com duas férias no ano ou Vivem de licença e faltam muito. Essas opiniões são lamentáveis.

As condições de saúde dos profissionais em geral, assim como dos professores, dependem das relações decorrentes das exigências para a realização do trabalho. Há trabalhadores que usam e abusam de licenças em todas as profissões, seus motivos são variados e merecem uma atenção maior, mas isso não justifica julgar toda uma classe por conta deles.

Em todos esses anos em que atuo na rede estadual, a realidade que percebo rotineiramente é a de professores que, muitas vezes, vão trabalhar doentes (febris, sem voz, com viroses, dor de cabeça, entre outros), porque isso é menos trabalhoso do que ir buscar atendimento médico e, praticamente, implorar por um atestado (constantemente negado) ou, se for o caso, por uma licença saúde.

Na última semana, essa negligência à saúde quase custou a minha vida.
Sabe aquela dorzinha de dente que você vai protelando? Primeiro, porque era fim de bimestre, depois, porque um remédio resolveu, e também porque eram tantas coisas para se colocar em dia: os projetos na escola, minha participação na luta por mais eventos culturais na cidade, entre outros... O salário também acabou, então, achei melhor deixar a consulta para o início do mês seguinte: Dia 10 resolvo! E já estava até com a consulta marcada!

Só que foi um pouco tarde demais... Na sexta passada, cheguei tarde em casa, sentia tanta dor que nem sei como aguentei... Meu coração acelerou, senti falta de ar, mal dormi e, quando cheguei finalmente ao dentista, que me atendeu em caráter de urgência, ele fez o que tinha que fazer e me mandou correr para o hospital mais próximo. Meu possível diagnóstico era de endocardite bacteriana, uma doença tão séria que até o Google te manda para o médico! A minha pressão arterial estava altíssima! Não consigo nem falar sobre tudo o que pensei quando o médico disse que o procurei no único dia em que ele poderia fazer algo por mim, isso porque, se eu tivesse esperado mais um dia, poderia ter morrido. Segundo ele, aquele mal-estar da sexta à noite pode ter sido o princípio de um infarto!


Nessas horas, a gente é bem egoísta, viu? Pelo menos, eu fui. Pensei, entre outros, nos meus filhos e em tudo o que eu poderia perder na vida deles: a escola, os boletins, encontros, namoradas, formatura, seus filhos.... É, passou um filme! Estou sendo dramática, mas também reconheço que a situação pede que eu reconheça seu drama...

Uma dor de dente apenas e eu quase não estava aqui para escrever este texto. Isso é muito sério, nunca sabemos quando é a hora de parar e ir ao médico, se ainda é possível deixar aquele mal-estar para depois... Escrevo como um alerta: professor, se cuide! Não negligencie a sua saúde. Não se deixe para depois. No “depois”, seus alunos ficam de aula vaga, seus projetos não acontecem e seus esforços não terão valido de nada. Professores, para transformar o mundo, precisamos cuidar de nós mesmos.

(Sou a Gisele Magalhães. Mulher, negra, mãe, artista, produtora cultural e professora de arte. Pertenço aos 0,1%, segundo o censo do MEC, de 2013, de professores da rede básica de ensino formados em Teatro e acredito na força dessa arte na formação do indivíduo e construção de sua autonomia.)